A segunda temporada da série de TV da Patrulha do Destino estreou no último dia 25. A primeira, na minha opinião, foi ótima: uma das melhores já feitas inspiradas em quadrinhos, ao lado de “Watchmen”, “Demolidor” e “Jessica Jones”.

O roteiro, as atuações e os efeitos especiais são acima da média, mas acho que há um fator bem interessante a ser observado: os personagens. Diversidade e personagens cheios de defeitos: essa é a Patrulha do Destino. Se não tivessem superpoderes meio estranhos, seriam como você e eu.

A Patrulha do Destino surgiu como mais um grupo de super-heróis dos quadrinhos em 1963. “Mais um?” Não. Definitivamente, não. Arnold Drake e Bob Haney foram os primeiros a agrupar personagens que destoavam dos super-heróis perfeitos, quase divinos (às vezes, divinos mesmo: Thor, por exemplo).

Uma proposta parecida surgiu na concorrente Marvel três meses depois: os X-Men. Tão parecida que os dois grupos são liderados por cadeirantes eruditos (Chefe, na Patrulha, e Professor X, entre os mutantes). Ambos os grupos também vêm com a mensagem de aceitar a diferença. Não ser igual aos outros não te faz pior do que ninguém. Ser minoria não te faz pior do que ninguém. Tem espaço para todo mundo.

Reler o parágrafo acima me faz refletir como esses conceitos permanecem terrivelmente atuais quase meio século depois.

O grande ponto por trás das histórias da Patrulha é que, antes de serem heróis, são humanos. Carregam culpas, traumas, arrependimentos. Claro, têm qualidades. E os bons roteiristas que o grupo teve (Arnold Drake, Grant Morrison, Rachel Pollack, Gerard Way) souberam explorar tudo isso: diversidade, humanidade… e superpoderes. Afinal, essa é uma história de super-heróis.

Enfim, fiz uma seleção de alguns dos personagens mais interessantes da Patrulha do Destino nos quadrinhos. Alguns já aparecem na série. Outros, torço, podem pintar por lá algum dia.

Niles Cauder (codinome heroico: Chefe) – cadeirante, um dos primeiros super-heróis com deficiência física. Possui uma inteligência absurda, muito carisma e segredos… condenáveis.

Clifford Steele (Homem-Robô) – personagem que teve membros amputados e substituídos por partes mecânicas. Poderia ser só uma espécie de androide, mas bons roteiristas lhe deram profundidade, como sentir dor-fantasma (em membros que não estão mais lá) e uma constante angústia ao lembrar do corpo que tinha e perdeu em um acidente.

Lawrence Taylor (Homem-Negativo) – mais um com problema físico. No caso, de pele, o que o obriga a usar bandagens o tempo todo. Sair na rua e virar o centro das atenções como se fosse uma “aberração” deu a ele uma personalidade mais introspectiva, quase traumatizada por não ser aceito como é.

Kay Challis (Crazy Jane) – já citamos personagens com particularidades físicas. Crazy Jane tem uma psicológica: são 64 personalidades habitando um mesmo corpo, com maneiras de falar, hobbies e até alergias diferentes.

Danny – já viu super-herói não-binário? A criação de Danny foi precursora nesse sentido. Não vou dar mais detalhes porque tudo o que envolve este personagem é surpreendente.

Rebis – uma personagem hermafrodita, outra raridade no mundo de quem usa uniforme, tem identidade secreta e acha normal sair voando por aí.

Se o Rebis te lembra o Homem-Negativo da série, é porque há uma conexão forte entre ambos. Mas também não vale a pena explicar pois tiraria o prazer da leitura.

Kate Godwin (Coágula) – você tem algum tipo de preconceito contra profissionais do sexo? A Patrulha do Destino não tem, e aceitou esta mulher trans que é capaz de mudar o estado físico das coisas do sólido para o líquido (e vice-versa).

Outras etnias – se o papel da Patrulha do Destino é aceitar o diferente, não faria sentido deixar outras etnias de fora. Assim, há representantes indianos (Arani Desai, a Celsius); negros (Joshua Clary, o Vendaval); japoneses (Kimyio Hoshi, a Doutora Luz); latinos (Devota, uma personagem tão misteriosa que seu nome de batismo nunca foi revelado); e coreanos (Mi-Sun Kwon, a Nudge).

Eu gostaria muito de ver uma personagem brasileira nesse grupo. Mas digamos que já há uma bela representatividade aí, não?

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Escrito por

Pedro Cirne

Meu nome é Pedro, nasci em 1977 em São Paulo e sou escritor e jornalista - trabalho no Estadão e escrevo sobre quadrinhos na TV Cultura.
Lancei dois livros: o primeiro foi "Púrpura" (Editora do Sesi-SP, 2016), graphic novel que eu escrevi e que contou com ilustrações 18 artistas dos oito países lusófonos: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor Leste. Este álbum contemplado pelo Bolsa Criar Lusofonia, concedido a cada dois anos pelo Centro Nacional de Cultura de Portugal.
Meu segundo livro foi o romance "Venha Me Ver Enquanto Estou Viva”, contemplado pelo Proac-SP em 2017 e lançado pela Editora do Sesi-SP em dezembro de 2018.
Como jornalista, trabalhei na "Folha de S.Paulo" de 1996 a 2000 e no UOL de 2000 a 2019.

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