(Este texto é uma outra versão de uma matéria publicada no Estadão: “‘Mulher-Hulk’, ‘Patrulha do Destino’: onde assistir aos melhores filmes e seriados de super-heróis“. )

Outrora “apenas” uma gigante americana dos quadrinhos de super-heróis, a Marvel construiu, de 2008 para cá, um caminho próprio levando seus super-heróis para fora das HQs. Primeiro, nos cinemas, com Robert Downey Jr. emprestando seu carisma ao Homem de Ferro. Muitos anos depois, experimentando em séries com parceiros (como “Demolidor”, com a Netflix) até finalmente apostar em um material 100% próprio, criado para seu canal, o Disney+ – a estreia foi o “WandaVision” (abaixo), em 2021.

O mundo próprio que a Marvel criou para o audiovisual deu tão certo que ganhou nome próprio (o Universo Cinematográfico Marvel – MCU, na sigla em inglês) e até “filhotes”: outros estúdios foram para o mesmo caminho de longas e séries ambientados dentro de um mesmo e coeso universo. A rival DC Comics tinha personagens muito mais conhecidos (Superman e Batman) e tentou, sob o comando do diretor Zack Snyder, ir para o mesmo caminho. O estúdio Universal quis criar seu “universo cinematográfico de terror”, com filmes interligados e alto orçamento – os astros Tom Cruise, Javier Bardem, Johnny Depp e Russell Crowe chegaram a posar para fotos antes de o primeiro filme estrear.

O projeto de terror da Universal foi por água abaixo logo no início e maioria dos filmes anunciados não teve nem trailer. A DC insistiu muitos anos, mas finalmente, neste 2022, desistiu de sua visão “realista e sombria” para super-heróis. James Gunn (você verá este nome algumas vezes neste texto) assumiu o lugar de Zack Snyder como mente criativa do audiovisual da DC e seus filmes não devem estrear tão cedo – os roteiros ainda estão sendo escritos.

Dentro deste contexto, o que podemos dizer sobre os filmes e séries de super-heróis lançados em 2022? Como em qualquer outro gênero, claro, houve altos e baixos – vamos falar só dos altos neste texto. Nem o próprio MCU acertou todas – produzindo bem mais do que apenas duas obras por ano, como no seu início, a Marvel tem se arriscado mais e dado uns tropeços. Mas, de uma maneira geral, ainda é o Universo Cinematográfico Marvel quem dita as regras, ou a DC não estaria tentando, mais uma vez, seguir seus passos. Abaixo, os destaques de 2022:

Dentro do Universo Cinematográfico Marvel

Mulher-Hulk: Defensora de Heróis”: esta série curta misturou muito humor, metalinguagem e a ótima atuação da Tatiana Maslany para entregar diversão ao mesmo tempo em que abordava temas como misoginia, machismo e a banalização da violência contra a mulher apenas para criar “entretenimento”. Dito assim, parece “palestrinha”, mas nada disso: foi diversão de qualidade.

Doutor Estranho no Multiverso da Loucura“: um longa que dividiu opiniões por parecer ser um episódio no meio de um filme maior. É difícil assisti-lo sem ter acompanhado o ótimo seriado “WandaVision” antes e, ao mesmo tempo, o longa termina com pontas abertas que parece que falta um desfecho. Mas não deixa de ser uma ótima aventura, carregada por ótimos efeitos visuais e por excelentes atuações, Benedict Cumberbatch e Elizabeth Olsen à frente, além de pequenos e incríveis easter eggs para fãs, como as participações do Senhor Fantástico e do Professor Xavier.

Pantera Negra: Wakanda Para Sempre” vem carregado de uma dupla tarefa. Primeiro, estar à altura do ótimo “Pantera Negra”, longa de 2018 e do qual é continuação direta. O longa original foi sucesso de público e de crítica, sendo indicado a sete Oscar (inclusive de melhor filme) e vencendo três. Mas o maior desafio foi honrar Chadwick Boseman, ator falecido em 2020 e que, sem o qual, o personagem Pantera Negra não teria virado o ícone que é hoje.

Ms. Marvel“: assim como “Mulher-Hulk”, uma série curta que diverte e aprofunda temas importantes. E, da mesma maneira que “Pantera Negra” mergulhou com respeito na cultura africana, “Ms. Marvel” o fez na cultura paquistanesa. A atriz Iman Vellani, islâmica e descendente de paquistaneses como a heroína que intrepreta (Kamala Khan, a Ms. Marvel do título), tem potencial para ser um dos rostos do MCU nos próximos anos.

Fora do Universo Cinematográfico Marvel

The Boys” (terceira temporada): poderes, uniformes, identidades secretas, pancadaria com efeitos especiais de muita qualidade… Sim, “The Boyes” é uma série de super-heróis engraçada e muito violenta, mas não só isso. Por trás das cenas de muita ação há uma crítica que parece ser ao próprio gênero dos super-heróis, mas que é voltada à indústria do entretenimento.

Patrulha do Destino”: o universo da DC Comics vai muito além de Superman e Batman – basta saber procurar. Mais do que isso, aliás: é preciso saber o que fazer com os personagens que se tem em mãos. A quarta temporada da série da Patrulha do Destino, que estreou em dezembro, retoma um grupo completamente disfuncional de seres com superpoderes – será que eles são, de fato, super-heróis? Humor, ação, drama e, acima de tudo, roteiros completamente imprevisíveis.

Pacificador”: James Gunn dirigiu dois longas para a Marvel com personagens da terceira divisão em popularidade, os tais Guardiões da Galáxia. O resultado foi ótimo e ele foi para a DC com um desafio similar: a série do Pacificador, um personagem ainda menos popular e bem mais complexo, cheio de defeitos e traumas. Gunn se saiu tão bem que, no fim do ano, foi escolhido para reerguer o universo audiovisual da DC.

Animações

Por algum motivo, a DC se sai melhor em suas animações do que em seus filmes e longas live-actions. “Justiça Jovem” estreou em 2010 e teve apenas quatro temporadas – a segunda metade da última estreou em março deste ano. Com muita criatividade e respeitando as dezenas e dezenas de personagens que aparecem, esta série animada merece um lugar de destaque entre as melhores obras audiovisuais de super-heróis do ano, apresentando muita ação enquanto aborda temas como luto, islamismo e sexualidade.

Harley Quinn”, protagonizada pela Arlequina, é uma verdadeira fábrica de memes e chega à sua terceira temporada de casa nova (HBO Max). O que “Justiça Jovem” tem de sério, “Harley Quinn” tem de anárquico, criando um humor voltado para o público adulto. Todos estão em sua mira – principalmente sua editora, a DC Comics. Nesta temporada, há até a participação especial de James Gunn, que ainda não havia assumido o universo audiovisual da DC, interpretando… James Gunn.

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Escrito por

Pedro Cirne

Meu nome é Pedro, nasci em 1977 em São Paulo e sou escritor e jornalista - trabalho no Estadão e escrevo sobre quadrinhos na TV Cultura.
Lancei dois livros: o primeiro foi "Púrpura" (Editora do Sesi-SP, 2016), graphic novel que eu escrevi e que contou com ilustrações 18 artistas dos oito países lusófonos: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor Leste. Este álbum contemplado pelo Bolsa Criar Lusofonia, concedido a cada dois anos pelo Centro Nacional de Cultura de Portugal.
Meu segundo livro foi o romance "Venha Me Ver Enquanto Estou Viva”, contemplado pelo Proac-SP em 2017 e lançado pela Editora do Sesi-SP em dezembro de 2018.
Como jornalista, trabalhei na "Folha de S.Paulo" de 1996 a 2000 e no UOL de 2000 a 2019.

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