Estamos na semana do Halloween… Então, o Hábito de Quadrinhos vai abordar, durante estes sete duas, obras de terror ou ligadas ao tema. E poucas se encaixam tão bem quanto “Batman – O Longo Dia das Bruxas”, que no original se chama “Batman: The Long Halloween”.

Trata-se de uma minissérie lançada em 13 volumes (claro que tinha de ser 13…), entre 1996 e 1997. A trama? Batman tenta descobrir a descoberta da identidade de um serial killer que mata apenas nos feriados.

O roteirista Jeph Loeb conseguiu uma grande sacada. Cada edição é temática, ligada a um feriado (ou data comemorativa): Natal, Dia dos Namorados, Dia das Mães etc. Isso deu possibilidade ao ótimo artista Tim Sale de criar imagens lindas, tanto na capa quanto nas internas. Suas páginas coloridas, com pouca poluição visual e bem diagramadas, são um desbunde aos olhos.

E o roteiro? Sim, sabemos que a história em quadrinhos é uma arte essencialmente visual. Mas esta HQ é citada, por algumas pessoas que respeito, como sendo uma das melhores do Batman.

Jeph Loeb sabe criar um clima. Ele vai te envolvendo, te deixando curioso. A história se passa no início da carreira do Batman – Harvey Dent, por exemplo, é um promotor de bom coração que ainda não foi transformado no Duas Caras. Quem será o Feriado (a alcunha dada ao serial killer)? Um dos futuros supervilões de Gotham? Um personagem novo? Alguém que você menos espera?

Grandes sacadas nem sempre resultam em grandes obras. Vou matar o Superman – e depois o ressuscito! Vou aleijar o Homem de Ferro – e depois ele volta ao normal! Vou matar o Capitão América – e depois o ressuscito! Vou aleijar o Batman – e depois ele volta ao normal!

Algumas dessas ideias, como se vê, sequer são originais. E… sim, todas foram publicadas.

Para mim, o que vale nas grandes sacadas é o desenvolvimento delas. O Homem-Aranha revelou sua identidade secreta ao mundo! Metrópolis, a cidade do Superman, foi completamente destruída! O Batman está investigando um assassino misterioso que só mata aos feriados! Mas tem um probleminha: o que acontece a partir daí.  Nos casos do Homem-Aranha e do Superman, os problemas foram resolvidos, literalmente, em um ato de mágica, conhecido informalmente como “roteirista com preguiça”. É um truque bobo.

No caso de “quem cometeu o crime?”, há algumas coisas a serem consideradas. Se você coloca o mesmo suspeito em todas as cenas dos crimes com a arma do crime na mão, ou ele é o assassino, ou você precisa de uma excelente desculpa para ele estar ali. Normalmente, ele não é o culpado, e o motivo apresentado é tosco. É um truque bobo.

Em qualquer caso, não só em histórias de “quem cometeu o crime?”, há de se respeitar o personagem. Não dá, por exemplo, para você mostrar o Capitão América tomando um tiro no peito no final de uma página, e na seguinte revelar que a bala não o feriu porque ele sempre foi um kryptoniano e você não sabia. É um truque bobo.

“Batman – O Longo Dia das Bruxas”, na minha opinião, entrega uma arte excelente e que casa muito bem com o texto. Mas não entrega um roteiro que sabe se resolver. Embora seja uma história publicada há mais de duas décadas, não vou revelar o assassino. Na minha avaliação, surpreende o leitor, pelo motivo errado: não faz o menor sentido. As pistas não estavam lá nem condiz com o personagem. Compare com “Crise de Identidade”, lançada 18 anos depois. Também gira em torno de um mistério de “quem matou?”. Surpreende o leitor, que pensa: “UAU! FAZ TODO O SENTIDO!”. Não há pista falsa nem deturpação da personalidade do assassino. Para mim, faz toda a diferença. Não há ambientação ou arte que sustentem truques que, na minha opinião, são bobos.

Respeito, claro, quem gosta de “Batman – O Longo Dia das Bruxas”. Mas não entraria no meu top 50 de histórias do Morcegão.

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Escrito por

Pedro Cirne

Meu nome é Pedro, nasci em 1977 em São Paulo e sou escritor e jornalista - trabalho no Estadão e escrevo sobre quadrinhos na TV Cultura.
Lancei dois livros: o primeiro foi "Púrpura" (Editora do Sesi-SP, 2016), graphic novel que eu escrevi e que contou com ilustrações 18 artistas dos oito países lusófonos: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor Leste. Este álbum contemplado pelo Bolsa Criar Lusofonia, concedido a cada dois anos pelo Centro Nacional de Cultura de Portugal.
Meu segundo livro foi o romance "Venha Me Ver Enquanto Estou Viva”, contemplado pelo Proac-SP em 2017 e lançado pela Editora do Sesi-SP em dezembro de 2018.
Como jornalista, trabalhei na "Folha de S.Paulo" de 1996 a 2000 e no UOL de 2000 a 2019.

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