Listas são infinitas, subjetivas e, claro, volúveis. Um leitor pode escolher seus cinco livros favoritos em janeiro, e em fevereiro seu top 5 terá obras completamente diferentes.

Dito isso, anteontem eu falei da incrível dupla Stan Lee e Jack Kirby e do que eles fizeram quando criavam os fundamentos da editora Marvel. Enquanto escrevia aquele texto, me propus a deliciosa tarefa de selecionar as cinco melhores histórias que criaram juntos.

Vamos a elas, em ordem crescente e completamente subjetiva:

5º – “A Chegada dos Vingadores!”, “Avengers” nº 1 (1963)

Reunir super-heróis em um mesmo grupo não era uma novidade quando a origem dos Vingadores foi publicada. A DC Comics já fizer isso décadas antes, com a Sociedade da Justiça. Mas reunir Thor, Homem de Ferro e Hulk na mesma revista, além dos desconhecidos Vespa e Homem-Formiga, foi uma grande sacada.

Enquanto a DC manteve Superman e Batman fora da Sociedade da Justiça para valorizar suas revistas individuais, Lee e Kirby apostaram justamente nos pesos-pesados Thor, Homem de Ferro e Hulk para dar liga. E deu.

Mais: houve uma inovação aqui. Lee e Kirby criaram um universo coeso entre seus títulos. Se o Homem de Ferro desaparecia em sua revista mensal, ele não poderia aparecer no título mensal dos Vingadores do mesmo mês. Criou-se um “universo compartilhado” nos quadrinhos… A DC Comics teve de correr atrás, e hoje todas as grandes editoras de super-heróis fazem o mesmo.

Curiosidade: cinco décadas depois, foi a mesma Marvel quem estabeleceu um “universo compartilhado” nos cinemas… A DC Comics teve de correr atrás – mas, sejamos sinceros, escorregou e está na lona até hoje. Seus filmes eram ruins demais. Vai ter de começar de novo.

4º – “Nasce o Homem de Ferro!”, “Tales of Suspense” nº 39 (1963)

É sempre difícil criar um super-herói sem repetir algo. O primeiro Lanterna Verde, por exemplo, era praticamente o Aladim do século 20: seus poderes vinham de uma lâmpada mágica, e até sua identidade secreta lembrava seu “antecessor”: Alan Ladd. O inteligente Bruce Banner e o bestial Hulk são uma versão verde de Dr. Jekyll e Mister Hyde. O Capitão América não foi o primeiro herói a se vestir com a bandeira americana – foi o Shield (Escudo), da concorrente MJL.

Mas um herói vestir uma armadura e sair voando por aí? Havia algo de original quando Tony Stark virou o Homem de Ferro. Provavelmente houve outros antes dele, mas menores e sem uma biografia tão complexa. Stark não era apenas um gênio científico, mas alguém com um problema cardíaco (se tirasse a armadura inteira, morreria), ególatra, mulherengo… Fora o carisma, claro.

O Homem de Ferro criou praticamente um filão de super-seres em armaduras, tanto na própria Marvel (Guardião, Dínamo Escarlate, Homem de Titânio) como na concorrência (Aço, Soviete Supremo, Leão Negro).

Em tempo: o crédito não pode ser apenas de Lee e Kirby: também participaram da criação Larry Lieber (irmão de Stan) e Don Heck.

3º – X-Men, “X-Men” nº 1 (1963)

Desde o primeiro deles, o Superman (1938), cada super-herói e super-heroína foi criado como se fosse tão perfeito quanto um deus, mesmo que não tivesse poderes (caso do Batman). Alguns, às vezes, eram deuses (Thor) ou receberam seus poderes de entes divinos (Mulher-Maravilha, Shazam).

Aí vieram a Patrulha do Destino, na DC Comics, e os X-Men, na Marvel, praticamente ao mesmo tempo. A premissa era a mesma: vamos mostrar “supers” que sejam mais parecidos com nós, normais.

Os X-Men eram liderados por um cadeirante careca (Professor X) e tinham, entre seus membros, algumas pessoas com problemas físicos que atraiam olhares desconfiados da sociedade.

A metáfora do preconceito e a questão de aceitar o diferente já estavam ali. Essa semente foi se aprofundando com o tempo, e o grupo foi ficando cada vez mais eclético: um soviético (em plena Guerra Fria); uma negra; gays; um brasileiro; uma afegã islâmica (anunciada na semana em que George W. Bush determinou a invasão ao Afeganistão).

E tudo começou ali, no primeiro “X-Men”.

2º – Prisioneiros do Doutor Destino!, “Fantastic Four” nº 5 (1962)

Era para ser mais uma aventura do ainda jovem grupo Quarteto Fantástico (sua quinta história, apenas), mas Lee e Kirby resolveram temperar a história com viagem no tempo e um novo vilão.

Nessa história, o tal vilão chantageia o grupo para uma missão “impossível”. O Quarteto se vê obrigado a aceitar, viaja no tempo para o passado e, ao retornar, derrota o tal inimigo… temporariamente.

Essa é a primeira aparição do Doutor Destino, aquele que viria a ser o maior inimigo do Quarteto Fantástico até hoje – ele aparece nas três vezes em que a equipe foi adaptada para o cinema, no longa que foi filmado e nunca lançado e talvez até ganhe um filme para chamar de seu no futuro próximo.

E os personagens Marvel nunca mais pararam de viajar no tempo. Para o bem e para o mal.

1º – “Trilogia Galactus”, “Fantastic Four” nº 48 a 50 (1966)

O Quarteto Fantástico sempre foi uma equipe de super-heróis com um pé na ciência. Com a sequência que se aprofunda nessa trilogia lançada em 1966, Lee e Kirby deram um passo além e colocaram o grupo contra ameaças de proporções cósmicas envolvendo uma ciência que nós, terráqueos, jamais entenderemos.

A “Trilogia Galactus” é um caldeirão de conceitos divertidos e ousados (lembre-se, estavam nos anos 60):

  • havia uma raça não-humana superpoderosa escondida em algum lugar do mundo: os Inumanos
  • uma espécie de deus onipotente observava a Terra sem que a humanidade soubesse: o Vigia
  • um gigante com poderes divinos alimentava-se devorando mundos (!) e queria COMER a Terra:  Galactus
  • por fim: uma entidade estranha, mais poderosa que qualquer herói da Terra, voava apoiando-se em uma… prancha: o Surfista Prateado

O Quarteto Fantástico lutava para salvar o planeta Terra inteiro e encontrando seres cósmicos invencíveis, criando uma fama interplanetária (!). Não era mais um grupo de super-heróis americanos ou terráqueos, mas universais… Um caminho sem volta!

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Escrito por

Pedro Cirne

Meu nome é Pedro, nasci em 1977 em São Paulo e sou escritor e jornalista - trabalho no Estadão e escrevo sobre quadrinhos na TV Cultura.
Lancei dois livros: o primeiro foi "Púrpura" (Editora do Sesi-SP, 2016), graphic novel que eu escrevi e que contou com ilustrações 18 artistas dos oito países lusófonos: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor Leste. Este álbum contemplado pelo Bolsa Criar Lusofonia, concedido a cada dois anos pelo Centro Nacional de Cultura de Portugal.
Meu segundo livro foi o romance "Venha Me Ver Enquanto Estou Viva”, contemplado pelo Proac-SP em 2017 e lançado pela Editora do Sesi-SP em dezembro de 2018.
Como jornalista, trabalhei na "Folha de S.Paulo" de 1996 a 2000 e no UOL de 2000 a 2019.

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