Você já leu algum mangá do Naoki Urasawa?
Eu nunca tinha ouvido falar dele. Mas como gosto de fuçar prêmios internacionais para conhecer artistas, anos atrás me peguei lendo a lista dos maiores vencedores do Shogakukan Awards e do Kodansha Awards – o Japão gosta tanto de quadrinhos que não tem apenas um “Oscar” para sua produção local, mas dois.
Raros artistas estavam em ambos: Osamu Tezuka (Shogakukan em 1957 e 1983 e Kodansha em 1977), por exemplo. Esse todo mundo sabe quem é – há até quem o chame de “deus-mangá”.
Mas… quem é esse Naoki Urasawa? Ele venceu o Shogakukan três vezes, o que já é raro (1989, 2000 e 2002) e o Kodansha uma vez (2001). Quando descobri seu nome, era inédito no Brasil, mas já tinha sido publicado na França. Aliás, publicado e premiado: “20th Century Boys” foi laureado em 2004 como melhor série no tradicional Festival de Angoulême.
Minha chance de conhecer seu trabalho chegou em 2006: “Monster”, excelente obra em 18 volumes, começou a sair no Brasil. Um resumo: homem persegue criminoso (um serial killer). Se fosse só isso, seria uma história comum. Não é.
Urasawa é um mestre do suspense. Suas histórias têm ritmo, envolvem, te deixam morrendo de vontade de ler a próxima edição. Mais do que isso: seus personagens têm coração. Todos! Os coadjuvantes também têm ricas histórias próprias, qualidades e defeitos, mistérios e capacidade de mudança. Fui lendo cada volume com brilho nos olhos, louco para chegar ao final.
Só que não.
A série foi cancelada no meio.
Anos depois, fui a trabalho para os Estados Unidos. Urasawa já tinha sido publicado lá. Aliás, publicado e premiado (percebe um padrão aqui?): venceu o Eisner Awards, o Oscar dos quadrinhos americanos, em 2011 e 2013, na categoria de obras asiáticas, por “20th Century Boys”.
No meu último dia lá, entrei em uma loja e comprei os volumes que me faltavam. Ao pagar, o caixa sorriu e me deu parabéns: aquela série, segundo ele, era maravilhosa e eu tinha um ótimo gosto! Conversando, descobri que ele não havia visto a série, mas assistido ao anime – que é bem fiel ao original.
Em casa, com calma, pude terminar os volumes. Shogakukan Awards, Kodansha Awards, Festival de Angoulême, Eisner Awards e o simpático caixa que não havia lido a série tinham razão: Urasawa é demais!
Mais duas séries de Urasawa já saíram no Brasil: “20th Century Boys” e “Pluto”. Aprendi uma lição com “Monster” (que a Panini fez o favor de relançar e publicar até o final): completei ambas antes de começar a ler… São obras cinematográficas, intensas, em que a ação não para.
A Japan House, aqui de São Paulo, organizou de outubro de 2019 a janeiro deste ano a exposição “Isto é Mangá – A Arte de Naoki Urasawa”. Uma mostra belíssima, que me deu a chance de ver de perto muito material dele que ainda está inédito por aqui.
Torço para que todos sejam publicados (até o final, claro), mas especialmente “Yawara!”, que é sobre uma judoca e tem muitas histórias ambientadas em uma Olimpíada. Como os próximos Jogos Olímpicos serão em Tóquio, quem sabe uma editora não se anima a lançar no Brasil?
Aliás, por falar em esporte… Em janeiro, a organização da próxima Olimpíada divulgou os 12 cartazes oficiais, todos criados por artistas japoneses. Só um era mangaká: você adivinhou, Naoki Urasawa.
Bela escolha, comitê da Tóquio-2020.
ps: Este post é o segundo de uma série chamada “Quadrinistas Maravilhosos”. A ideia é publicar 15 textos nas próximas três semanas. Ontem, falamos do espanhol Miguelanxo Prado, e amanhã é a vez de Alex Ross.